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Menina de nove anos encontrada morta em Guaíba pedia abraços, dormia em carro abandonado e cuidava do irmão mais novo

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Foto: Reprodução

Kerollyn Souza Ferreira teve o corpo localizado na manhã de sexta-feira dentro de contêiner de lixo próximo da casa onde vivia com a família. Polícia Civil prendeu a mãe, Carla Carolina Abreu Souza, 30 anos, de forma temporária. Causa da morte ainda será confirmada pela perícia

Na quinta-feira pela manhã, Kerollyn Souza Ferreira, nove anos, esteve em uma escola perto da casa onde vivia, no bairro Cohab Santa Rita, em Guaíba. A menina costumava ir ao local buscar doações de alimentos e roupas, e levar o irmão mais novo para estudar. Durante a visita, recebeu um par de brincos de uma funcionária. O presente a deixou radiante. Na manhã seguinte, o corpo da criança foi encontrado perto dali, dentro de um contêiner de lixo. A mãe, Carla Carolina Abreu Souza, 30 anos, foi presa de forma temporária.

As circunstâncias da morte de Kerollyn ainda são averiguadas pela Polícia Civil. O laudo de necropsia, produzido pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP), deve apontar o que causou o óbito. Até o momento, o que se sabe, segundo a polícia, é que ela vivia em circunstâncias de negligência e possível maus-tratos.

No bairro Cohab Santa Rita, onde a garota morava com a mãe e três irmãos, os relatos são de que ela vivia uma situação de abandono. Era num carro abandonado, numa praça perto de casa, que a menina se abrigava e dormia muitas vezes, segundo testemunhos apresentados à Polícia Civil.

— A menina vivia uma condição de maus-tratos permanente. Inclusive, a delegada representou pela prisão da mãe, pelo crime de tortura. Em razão de tudo que apurou no dia, dos vários relatos de violências sofridas pela criança. Não tinha nenhum tipo de amparo. A mãe tinha o costume de filmar a menina, dizendo que era endiabrada. Na verdade, era uma criança de nove anos que queria brincar e vivia sem atenção nenhuma — descreve o chefe da Polícia Civil, delegado Fernando Sodré.

Vizinhos e familiares descrevem uma criança carinhosa, que costumava pedir abraços e beijos. Vaidosa, Kerollyn adorava anéis, pulseiras, brincos, e fazer penteados.
— A Kerollyn era uma menina encantadora. Por onde passava, deixava amor. Ela amava ser uma princesa. Era toda delicada. Era uma espoleta, arteira. Amava um colinho. Sempre carinhosa com todos, a Kerollyn era um anjo. O anjo mais lindo que passou pela minha vida — descreve uma familiar da menina, que preferiu não se identificar, por receio de represálias.

Ela se sentia responsável pelo irmão. Ela que trazia a criança para a escola. Vinha buscá-lo. Nós gostávamos muito dela.

A criança era zelosa com os irmãos, e costumava levar um deles ao colégio todos os dias.

— Ela se sentia responsável pelo irmão. Ela que trazia a criança para a escola. Vinha buscá-lo. Nós gostávamos muito dela. Nesse momento que fomos afetados pela enchente, ela vinha pegar doações de roupas, fraldas para o irmão. Era uma criança bem participativa, nesse sentido, na escola — descreve a diretora Sílvia Vitória da Rosa Lopes.

Descoberta da morte

O corpo de Kerollyn foi encontrado ao amanhecer da sexta-feira (9), dentro do contêiner, por um reciclador, que alertou os vizinhos. O agente socioeducativo Alexandre Santana estava perto do local e foi um dos impactados pela descoberta da morte da criança. Assim que perceberam que poderia ser a menina, começaram a ligar para a mãe dela.
— O pessoal não queria acreditar. Era uma criança linda, estava sempre brincando aqui pela frente, andando de bicicleta com as outras crianças aqui na praça. Estou abalado, não sei quanto tempo vai passar isso. É uma coisa inacreditável, tu encontrar uma criança jogada no lixo. Minha esposa chorou muito, tive que buscar um calmante para ela, porque foi uma coisa, sei lá. Não sei como explicar o sentimento, não só meu, mas de todas as pessoas que presenciaram essa situação — desabafa.

Um ponto que despertou a atenção dos policiais é que, no momento em que foi informada de que um corpo havia sido encontrado no contêiner, e de que poderia ser Kerollyn, a mãe não esboçou reação, demonstrando o que foi entendido como indiferença. Devido aos relatos de maus-tratos, a polícia solicitou a prisão da mãe por tortura. Já o Ministério Público se manifestou entendendo que há elementos para a prisão temporária da mãe pelo homicídio da criança. A Justiça acabou acatando o pedido e a mulher foi presa no sábado.

Era uma criança linda, estava sempre brincando aqui pela frente, andando de bicicleta com as outras crianças aqui na praça. É uma coisa inacreditável, tu encontrar uma criança jogada no lixo.

A polícia ainda não sabe o que causou a morte de Kerollyn. Uma das possibilidades apuradas é a de que a mãe tenha administrado algum sedativo na menina, e que isso tenha causado o óbito. No entanto, isso só poderá ser confirmado pela perícia. São verificadas imagens de câmeras de segurança, na tentativa de identificar quem depositou o corpo da criança no contêiner.

— Não tinha sinais externos de violência no corpo, que pudesse ensejar a morte. Dependendo da perícia para saber a causa. Mas sabemos que a mãe é responsável direta ou indiretamente, pelo dever que tinha de cuidar, pela omissão — afirma o delegado Sodré.

Conselho Tutelar já havia sido acionado
Maikon Correia, que é pai de outra filha da mulher, afirma que procurou o Conselho Tutelar diversas vezes para relatar a situação vivida pelas crianças. O vigilante diz que a menina costumava pedir comida na casa de vizinhos:
— Era uma abandono. Ela sempre deixava as crianças sozinhas. A guriazinha passava fome, com os outros irmãos dela dentro de casa, quando a mãe saía. Tentei de várias formas ajudar. O Conselho Tutelar fechou os olhos. Isso que me dói. Essa querida criança podia estar com vida, se algum órgão público tivesse prestado atenção. Tudo era iminente. O que estava acontecendo com a vida da Kerollyn, era iminente. Todo mundo estava sabendo.
Da mesma forma, o pai de Kerollyn, Matheus Ferreira, que vive em Santa Catarina, relatou pelas redes sociais ter procurado o Conselho Tutelar ao menos seis vezes. Em julho de 2022, registrou ocorrência contra a mãe da menina, por ameaça. No relato, ele afirmava estranhar o comportamento da filha. “Nada vai trazer a minha filha de volta. Isso é revoltante. Por diversas vezes eu tentei”, escreveu em relato na internet.
Tudo era iminente. O que estava acontecendo com a vida da Kerollyn, era iminente. Todo mundo estava sabendo.
Em entrevista à RBS TV, na sexta-feira, a conselheira tutelar Ieda Lucas confirmou que a família vinha sendo acompanhada pelo órgão. Negou que o Conselho Tutelar tenha se omitido de realizar atendimentos no caso.
— Todas as denúncias que foram feitas dessa família foram atendidas. A gente luta para que a criança permaneça no seu lar. A gente estava acompanhando, sim. Não havia risco de vida todas as vezes que fomos — disse.
A conselheira afirmou ainda que, na sexta-feira anterior à morte da criança, a mãe entrou em contato por telefone informando que a filha estava em surto, querendo sair para a rua. Sobre essa situação, disse que não podia ir até a casa com a criança nessa situação, e que orientou a mãe da menina a buscar atendimento do Serviço Móvel de Urgência (Samu).
No momento da entrevista, a conselheira não soube informar se houve novo contato ou visita à família de Kerollyn após esse episódio, mas disse que a menina teria sido levada para atendimento médico.
— Ela estava assistida sim, por nós. E foram feitas todas as medidas. Uma tragédia, lamentável. Foi uma fatalidade. Estamos muito abalados. Estamos vendo o que se pode fazer para as demais crianças, que estão acolhidas, num lugar seguro — disse.
Nesta segunda-feira (12), em novo contato com o Conselho Tutelar de Guaíba, que informou que não irá se manifestar sobre o caso, para não atrapalhar as investigações. Questionada sobre a conduta do Conselho Tutelar, a Polícia Civil informou que vai apurar todas as responsabilidades do caso.
Contraponto
A Defensoria Pública do Estado informou que representou a mãe durante a audiência de custódia. Cabe à investigada definir se seguirá sendo representada pela instituição. Caso siga na defesa, a Defensoria Pública só se manifestará nos autos do processo.
Fonte: GZH
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